terça-feira, 28 de outubro de 2014
UM POETA SECO E REAL
Por Bioque Mesito |
A
melhor qualidade que um poeta possa possuir é a sua verdade. Mesmo que, às
vezes, seja nua e crua. A máxima pessoana é, na maioria das vezes, deglutida da
pior forma. O fingimento poético não é nada mais nada menos que o curinga do
baralho, e o poeta não é um ser hipócrita, dissimulado, louco, irresponsável,
perdedor, que só vive de cabeça baixa como pensa um monte de gente.
Talvez,
por atitudes de alguns poetas (inclusive, em São Luís do Maranhão, há poetas
que encaminham toda a sua trajetória como um pária, vivendo no lodo da
existência; outros reclamando de barriga cheia, achando que para ser poeta de
verdade é preciso vender mais de dez mil cópias em uma edição de livro) menos
desavisados, isso aconteça.
No
mundo da poesia, tem poeta que escreve sobre a sua cidade natal, sobre o rio
que passa por sua cidade, sobre a namorada, sobre a profissão que exerce, e tem
até os que nem mostram para ninguém os seus versos. Há todo tipo de poeta, mas
observamos logo de cara para o que veio um poeta ao mundo: para ter um estilo
próprio ou para ver a carruagem passar.
Fernando
Atallaia escolheu o primeiro caminho, ou melhor, escolheu o estilo seco,
verdadeiro e com o discurso agudo e forte, o que não fazem muitos escritores
que preferem pontuar suas criações em conjecturas sociais. Em seu Ode Triste
para Amores Inacabados (seu livro de estreia) atesta isso, quando nos fala no poema Dependências:
Toda poesia tem seu silêncio
Aposta na febre da palavra ainda
morta
e vicia pelos tragos de agonia
Não há poesia que caiba em um só
banheiro
Muitas quedas de alegria já
romperam seus remédios
Toda poesia tem suas dependências
Porta de mundo para muitos
universos
Entradas de setas para o
inesperado.
Ou
ainda, no equilibrado e tácito A Casa:
A casa sobre o chão me desperta asas para um
voo tênue
A fragilidade do concreto sob a casa nada tem de frágil
O que escorrega entre os telhados se esvai em quartos para fora
E o que sustenta a flora não projeta muros para dentro
Tenho de pedra as mãos e a fala presa às paredes
A casa é fortaleza para pele
E eu, de rudimentar, tenho os ossos na poeira
A fragilidade do concreto sob a casa nada tem de frágil
O que escorrega entre os telhados se esvai em quartos para fora
E o que sustenta a flora não projeta muros para dentro
Tenho de pedra as mãos e a fala presa às paredes
A casa é fortaleza para pele
E eu, de rudimentar, tenho os ossos na poeira
Ode Triste para Amores
Inacabados até parece, no primeiro momento,
um livro romântico, mas não se enganem, o romantismo atallaiano é pura
cáustica, alarido de muitas possibilidades de se amar. Muitos poemas deste
livro se interligam nesse sentido, mesmo que essa não seja uma proposta proposital
do poeta, como são os casos de Amores à parte:
Amei com a tempestade à garganta
Com o grito preso aos lençóis
Amei com todos os nós
Entre mim e as tuas mãos a toda solidão da minha vida
Os palácios as feridas de ontem do hoje e sempre
Dores à parte eu também amei
Com os grilhões de sua fútil arte, a arte fútil de aprisionar donzelas
Em quadros ríspidos de paredes
Sereias mal amadas sem nenhum mar.
Ou em Cafajeste em
quatro tempos:
1. Antes de perder o chão pretendo voltar.
2. Posso não ser o mesmo, mas pretendo.
3. Acredito no amor que serei perdoado.
4. Minha alma disposta ainda pula muros.
Ou
ainda em Verso
Antigo:
Saqueei a vida da mulher que me apareceu vindo do interior
Do interior de suas faltas de seus olhos de seus
ossos
Com uma mala desbotada de fotografias
A mulher é nova e tem dois filhos
O primeiro chora o outro morre
Todo dia é a
mesma coisa
Tento
amenidades
(...)
A mulher que a
vida verteu em seus longos e
Pontiagudos
saques de amor e medo
A mulher que
estava ali bem ali nos cabarés de suas saias apontando seus lamentos para um
bolso imundo.
O aparecimento de Atallaia para a poesia não é
de hoje ou de agora. Caminhante com um bando de poetas, desde a década de
noventa do século passado, como são os casos de Dyl Pires, Hagamenon de Jesus, Antônio
Aílton, Bioque Mesito, Ricardo Leão, Rosemary Rêgo, Paulo Melo Souza, e tantos
outros, Atallaia divide-se entre a música e a musa, entre o violão e a pena de
escritor. Virtudes essas que não lhe atrapalham, mas colidem-se para um grande
feito: a poesia.
O
livro Ode Triste para Amores Inacabados é uma importante
contribuição para a poesia ludovicense. Seja por instalar um romantismo rouco e
louco ou por se tratar de uma entrega autoral de quem aprendeu a desmascarar a
hipocrisia artística das últimas décadas.
Para dar ponto final aos
comentários, um poema que eu gostaria de ter feito e não o fiz, talvez por
falta de coragem e desprendimento, o intrigante e belo Casa-te
comigo e me calo. Um poema que, a meu ver, reflete todo o clímax erótico do
livro sem ser carregado de expressões corriqueiras ao tema; um poema dedicado a
Mônica Mattos, uma famosa e linda atriz pornô brasileira:
Mônica Mattos não merece
este poema.
É em pouco e quase nada sem a inspiração desejada e à revelia da beleza que ele agora fala- canta-goza sem a pura verdade (pré)sentida.
É em pouco e quase nada sem a inspiração desejada e à revelia da beleza que ele agora fala- canta-goza sem a pura verdade (pré)sentida.
Mônica Mattos de fato não
merece este poema que engasga em sua torpe necessidade vulcânica de falar às
águas cáusticas-frias maçantes de uma verborragia infame entre/mentes.
Mônica e suas
reentrâncias satânicas de um céu abaixo da semântica que não espanta que não
santa e porque não nas tenras carnes das damas de 22 anos? Ainda assim este
pobre e laico e polifônico poema é uma desonra ao silêncio de suas ancas.
Mônica
Mattos não amaria este poeta por este ridículo poema que ousa falar-lhe às
sombras de sua lascívia aos assombros de suas vaginas- aos horizontes de suas
volúpias e na pequenez dessa sintaxe como um ácido ruim à boca fria ela jamais
mereceria este biltre e raso poema.
Perdoe-me Mônica. Foi por instinto assim como sinto que quero cantar-te os lindos olhos famintos dos sofás solitários que apontados à imaginação caem como pães às imagens do meu falo.
Perdoe-me Mônica. Foi por instinto assim como sinto que quero cantar-te os lindos olhos famintos dos sofás solitários que apontados à imaginação caem como pães às imagens do meu falo.
Perdoe-me querida. Casa-te comigo e me calo.
Bioque
Mesito é um dos mais representativos poetas maranhenses da década de 90. Premiado
em concursos literários nacionais, tem dois livros publicados e três inéditos. Integrou o Grupo Curare de Poesia.
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Parabens, realmente Fernando escreve muito bem poesia, de uma forma diferente, parabens Atalaia, voce e fera mestre.
ResponderExcluirProfessor Cassio Oliveira
Parabéns linda matéria. Como na poesia, encontramos espaço para independência num grito nunca perdido. Levado pelo vento, encontra eco, planta sua bandeira mesmo num mundo desigual e sem sentido. Do amigo Randolfo.
ResponderExcluirA poesia maranhense em sua efervescência com Fernando Atallaia
ResponderExcluirParabens meu irmao e amigo.
Allysson Ribeiro
PREZADO FERNANDO VOCÊ É UMA GRATA SATISFAÇÃO NO MEIO CULTURAL DE NOSSA TERRA: CRIATIVO, LÚCIDO E DE UM BOM GOSTO INCONTESTÁVEL. PARABÉNS MEU IRMÃO...... CONTINUE ASSIM. SOU SEU FÂ.
ResponderExcluirSem duvida um dos maiores do maranhão na atualidade. Bioque acertou em cheio.
ResponderExcluirEudes de Sousa, escritor e pesquisador do IHGM
Muito bom, parabens, tb sou sua fã querido. Sua amiga Ruth Marcia
ResponderExcluirO POEMA A CASA É UMA OBRA PRIMA DA POESIA, SUCESSO POETA ATALAIA E MUITAS POESIAS PELA FRENTE PARA O AMIGO NOS BRINDAR COM ESSA EXCEPCIONAL ARTE. LINALDO PEREIRA , POETA CAXIENSE DA TERRA DE GONÇALVES DIAS
ResponderExcluirMuito show de bola. Nota 10 cara, beijossssss
ResponderExcluirSara- Observatório-UFMA